Por Alexandre de Paula - estudante de Jornalismo na Universidade de Brasília
De repente, percebo que escrevo sobre folhas escritas do meu caderno. Letras sobre letras. O azul da caneta rompendo o cinza fosco do lápis. O passado, às vezes, é inútil — penso. E logo me envergonho de ceder ao lugar-comum por uma frase de efeito. As citações que rabisco ensaiam um grito de dor, mas eu não ouço. Sei que não morrem, a não ser que sejam meus poemas velhos ou inícios de contos que nunca chegarão ao fim.
Há um ano, eu escrevia aquela frase agora coberta pelo sangue azul de uma irmã mais nobre. Há um ano, considerava que aquela frase boba precisava ser guardada. Acreditei que muito tempo depois eu ficaria satisfeito por ter a perspicácia de registrá-la para nunca mais perdê-la. Não foi bem assim. O primeiro senso é o espanto. Não pelo valor literário ou pela sabedoria do que anotei. Eu apenas não consigo descobrir o motivo de tê-la destacado. Aquela frase, entre tantas de um livro muito bom. Por que ela? Que hoje não me diz nada, que se perdeu por entre outros rabiscos e quase teve seu lugar ocupado por um balãozinho inútil que desenhei.
Aquela frase, entre tantas de um livro muito bom. Tenho o livro à minha frente, mas prefiro deixá-lo fechado, o condeno ao pó das obras esquecidas sobre a estante, que não é o pior lugar para se estar. (Tenho meu index particular onde escondo minhas vergonhas mais escabrosas.) Temo abrir o livro. Tenho medo de abri-lo e me ver diante do imbecil que há pouco tempo o adorava. O idiota que escreveu aquela frase na primeira página do seu caderno. Aquela frase que não vale quase nada.
Genial! Eu devo ter dito isso a algum amigo, eu devo ter me perdido em elogios vagos e pretensamente inteligentes sobre aquela frase, sobre aquele livro. “Ah, o autor e suas artimanhas de estilo. O jeito brilhante de fazer poesia com a linguagem vulgar. O lirismo. Sim, o lirismo de um resistente, que não aceita as amarras de um mundo cruel.” Eu devo ter dito. Bem, não tenho dúvidas. Disse, sim.
Temo as frases que escrevo agora. Tenho medo do sujeito que as lerá daqui a alguns anos e da crítica que vai fazer a si mesmo. Como admitir que o projeto falhou? As coisas que eu achava geniais são banalidades e a minha genialidade nunca passou de um desvario, de uma ideia megalomaníaca que não poderia confirmar-se.
Diante de isso tudo, eu me sinto um tanto perdido. Feito um náufrago. Um náufrago que, ao ser encontrado, olha-se numa velha fotografia e não se reconhece. Alguém que não é mais, que se perdeu na própria tessitura da vida. Melhor, me sinto como uma canção que de tão adaptada já não é a mesma. E entendo que só me resta esperar que o novo intérprete seja sempre melhor.
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