Por Ana Carolina Datore e Even Vendramini
Mais do que cultura. Estilo de vida, ideologia. Na década de 1970, nos subúrbios onde viviam negros e latinos de Nova Iorque, que enfrentavam problemas sociais, os jovens se encontravam nas ruas. Ali a origem de manifestações artísticas nas ruas, como música, dança, poesia e pintura. Ali o início do hip-hop.
O condado do Bronx, de maioria negra, deu o pontapé inicial para mudar a realidade das pessoas que ali viviam atormentadas pelas gangues de rua. A ideia era transformar a violência em cultura, em energia. Afrika Bambaataa é considerado o padrinho desse movimento social. No dia 12 de novembro de 1973, fundou a Zulu Nation, uma organização que tinha como principal objetivo promover a autoafirmação e os combates invocando “paz, união e diversão”. Outro nome importante no surgimento da cultura hip-hop é Kool Herc. Mudou-se da Jamaica para Nova Iorque aos 12 anos. Levou seu conhecimento de sound system, um sistema de som tradicional na Jamaica de grande potencial para atrair as pessoas.
Armas e violência deixadas de lado. As gangues encontraram nas novas formas de arte um jeito diferente de batalha. A cultura hip-hop serviu e serve, até hoje, como ferramenta de integração social e de ressocialização de jovens das periferias.
Já no Brasil, o berço do hip-hop é a cidade de São Paulo. O movimento teve seu início em meados dos anos 80. Os tradicionais encontros aconteciam na Rua 24 de Maio e no metrô São Bento, de onde surgiram vários artistas, como o grupo de rap liderado por Mano Brown, Racionais MC’s.
Os elementos do hip-hop
Há quem diga que o movimento é constituído por apenas quatro elementos: o rap, o breakdance, o DJ e o grafite. Porém, o hip-hop é muito mais complexo do que se pode imaginar. O rap é a trilha do movimento interpretado pelo MC (mestre de cerimônia) e possui várias vertentes, desde protestos contra a repressão, até amores. O principal tema é notoriamente o valor da sociedade.
O breakdance é o termo usado para se referir aos dançarinos do rap, o B-Boy e a B-Girl. O DJ representa a essência da cultura hip-hop, já que foi em torno do rap que surgiram os outros elementos. Ele é responsável por conduzir as rimas dos MC’s, as danças dos B-boys e também a inspiração dos grafiteiros. Através da arte visual, o grafite traz inscrições e mensagens. Hoje em dia, é considerado uma das grandes formas de arte contemporânea.
Ao se tratar da complexidade do estilo aparece a chamada “consciência” como quinto elemento. É uma espécie de consciência social coletiva. Outro elemento indispensável é o beatbox. Em português significa “caixa de batida”, é a percussão vocal do hip-hop. O beatbox surgiu nas batalhas de MC’s que não tinham nenhum equipamento para reproduzir as batidas das músicas, ou seja, o beat é o som emitido pela boca e o box é a mistura de sons. Tudo ao mesmo tempo, em sincronia.
Mesmo assim, o movimento vai além das rimas coordenadas e de entretenimento. Ele trabalha com núcleos de aprendizagem educacionais, oficinas, centros de inserção de jovens ao mercado de trabalho e blocos culturais.
Pode-se ir muito mais longe ao se tratar dessa cultura. Hoje, o hip-hop está em sintonia com o cinema, com a literatura, com a moda, com o mercado de trabalho. Em terras brasileiras, o rap se mistura com outros estilos musicais, como o samba e o rock. Além, é claro, de quebrar o tabu e incluir mulheres e crianças nessa cultura.
Move Step: A cena frutalense no hip-hop
A cidade de Frutal possui um grupo de hip-hop que literalmente rouba a cena por onde passa. O Move Step é formado por sete integrantes que tem em torno de 20 anos de idade. Cinco deles nos receberam no barracão onde ensaiam. Diego Souza, o Paredão; Rafael Menezes, o Play; Lucas Santos, o Coruja; Jhonatan Junior, o Bob e Langmar Soares, o Lang. No mês de outubro, o Move Step se apresentou em Goiânia, em um torneio nacional. Foram 32 inscritos e o grupo foi um dos escolhidos. O vencedor do torneio vai se apresentar na França. O Move Step teve uma boa performance, mas não conseguiu ser o campeão.
Os treinos acontecem em um barracão cedido pela prefeitura há quatro anos, mas o grupo, em si, está junto há nove. Antes de terem esse espaço para treino, os jovens dançavam na rua, nas quadras. Hoje, há um local próprio para isso.
“A gente se apresentava aqui na cidade antigamente, mas não tem valor. Eles pagam grupos de fora pra vir e a gente fica aqui. Querendo ou não, ainda é uma coisa bem discriminada, as pessoas não sabem o que é, falam que hip-hop é coisa de malandro. Mas nem sabe o que a gente faz”, dizem os integrantes do grupo.
Quem assiste aos treinos percebe que o esforço é grande por parte dos integrantes. A coreografia é levada a sério e, três vezes por semana, eles se reúnem para dançar, ensaiar e se divertir. Os dançarinos contam que no início de grupo havia cerca de 100 pessoas dançando hip-hop na cidade. Hoje, sobraram apenas os sete. Para aprender, era um olhando o outro. Na época, ainda não tinham acesso à internet ou a vídeos. “A gente tinha que ver alguém dançando pra tentar fazer. Agora tudo que você procura tem na internet.”.
Reconhecimento necessário
O grupo, ainda com dificuldades, recebe o apoio da Prefeitura de Frutal através da Secretaria de Cultura. Segundo a Secretária de Cultura, Edimar Reis, a ideia é levar o hip-hop para todos os cantos da cidade, justamente por ser uma cultura que ainda sofre com o preconceito das pessoas. O intuito é conscientizar sobre a essência do hip-hop e reconhecer os valores do movimento.
A secretária falou ainda sobre sua admiração em relação ao hip-hop e aos meninos do Move Step: “A gente fica feliz por isso, por saber que as pessoas que moram aqui e que tem essa cultura estão levando o nome da cidade para fora.”.
O grupo recebe também ajuda de alguns moradores. Felipe Mendonça disse acompanhar o grupo desde a sua formação. “Acho que tudo que nós pudermos fazer para acrescentar no desenvolvimento cultural do nosso meio é uma soma viável, em todos os aspectos. Eu acredito neles por terem esse ideal, gosto do estilo e sei que eles possuem um potencial favorável entre os 5 melhores do Brasil.”, diz Felipe.
Ao destacar sua admiração pelo trabalho da turma, Felipe se mostrou realmente por dentro de todas as conquistas dos meninos, enumerando cada troféu e participação em campeonatos. “São formas que trazem na bagagem um valor histórico-social que requer um olhar atencioso que é desprezado pelos governantes da cidade. É interessante mostrar que o Move Step possui, além de outros, mais de 12 troféus em primeira colocação entre os mais importantes Campeonatos do Brasil.”, conclui.
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