É preciso chegar

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Por Priscila Minani

Um meio de transporte. Uma velocidade média de 30 km por hora. Cerca de 70 quilômetros de linha. Aproximadamente 55 estações. Transportando por dia 3,6 milhões de passageiros. Feita tal descrição fica fácil imaginar do que se trata. Com quase 40 anos de funcionamento, o Metrô de São Paulo é cenário de milhares de histórias. Metrô e São Paulo são inseparáveis. 

04 horas e 40 minutos da manhã. Eis o começo da jornada. Trata-se da primeira leva de milhares das mais diferentes pessoas, para os mais diferentes destinos. O metrô para na estação, mas cada indivíduo segue mais além. Cada trem com seis vagões leva 2000 passageiros por viagem, ou seja, são 2000 histórias singulares por vez. E o metrô não para. Com o horário de funcionamento variado, é certo que durante todo o dia as pessoas que passam por ali deixam um resquício de sua vida por aqueles vagões.

É hora de aguçar o método da observação. É possível encontrar rostos felizes, abatidos. Sorrisos sinceros, disfarçados. Cidadãos batalhadores, porém cansados e pensativos. É bem provável que o metrô funcione como uma espécie de sala de análise em movimento, pois quantas dessas pessoas não param nestes instantes de viagem para pensar nas suas vidas, ou apenas em como foi mais um dia dela? Certamente, a maioria.

Os que deram sorte vão sentados. Os demais se acomodam onde há espaço. Se puder  chamar de espaços vãos onde pernas, braços e troncos se misturam, num cipoal de gente. Em poucos segundos as portas se abrem e o vão entre os bancos é preenchido. Braços desconhecidos se entrelaçam, buscando segurar nos corrimãos para não cair com o impulso do trem. Pés, que competem por centímetros, procuram fixar-se ao chão. Cinco, seis, sete minutos e chega-se a outra estação. Novamente as portas se abrem e há aquele vai-e-vem de pessoas. Um sufoco. Alguns tropeções. Muitos esbarrões. Todo mundo tem pressa. Aliás, São Paulo é uma tremenda correria.

De volta à parte interna do metrô, é curioso notar como estão concentradas num mesmo lugar anatomias tão diferentes. Brancos, negros, baixos, altos. Olhos verdes, puxados. Muitos brasileiros e alguns estrangeiros. Pessoas a passeio, a maioria a trabalho. Crianças, idosos, predominando os adultos. Uma variedade de estilos, crenças, predileções. Uma generalidade de perfis exclusivos. Indivíduos que se olham, quase sempre se ignoram, mas que compartilham o mesmo ambiente.

No metrô não há pobres e ricos. Ele é utilizado pela massa, mas também atinge a classe média e alta. Sujeitos simples, de bermuda e sacola podem estar ao lado de um executivo a rigor, com sua maleta preta de couro. Não há preconceito. O que vale é a necessidade de ser transportado com rapidez em meio ao trânsito caótico da capital paulista. 

E é esse o cotidiano de quem passa pelo metrô. Das janelas a impressão que se tem é que é a cidade que se move e o mundo lá fora é completamente isolado da realidade interna. Talvez porque as estações subterrâneas só dão idéia de integração ao mundo real quando se atinge a superfície.

Por todo lado há passos apressados de quem não pode perder tempo. O metrô segue o ritmo dos paulistanos e os visitantes devem se adaptar. Dentro da estação, tudo busca ser o mais organizado possível. Bilheterias blindadas, placas de indicação por toda parte, catracas programadas para dar acesso ao metrô. Uma construção imensa, uma estrutura surpreendente, que funciona por debaixo das ruas engarrafadas.

 No metrô também há seus momentos de caos, mas a multidão que entra e sai muda a toda hora. A velocidade da vida no metrô é infinitamente maior que a vida humana. Se fosse um ser humano, já teria vivido bilhões de anos e teria feito trilhões de cirurgias, pois cada novo passageiro é como se fosse um membro daquele gigantesco corpo. Afinal, o que seria do metrô sem os seus usuários? E o mesmo vale para o outro lado, pois o que seriam dos cidadãos sem o metrô? Só uma certeza: seriam mais atrasados.