Por Rafael Del Giudice Noronha
A velha frase “pago tudo que consumo com suor, do meu emprego”, da canção “Maneiras”, poderia, porque não, sofrer algumas alterações. Calma. Não estou querendo ser compositor e muito menos metido a músico. Só temos de notar que, pagamos sim, com suor dos nossos empregos, mas, muitas vezes, com uma taxinha extra. Taxinha extra? Sim. Vai dizer que você que está aí com o 360 em mãos nunca atrasou uma conta, por um motivo ou outro? Pois é.
Atrasar o pagamento não é vergonha nenhuma. E, por favor, caro leitor, não se sinta ofendido com o primeiro parágrafo desta matéria. Não lhe chamo de caloteiro, claro que não! Estas palavras acima servem apenas para justificar o emprego de inúmeros jovens frutalenses. São os cobradores.
Caracterizados em sua maioria por uma bicicleta e uma bolsinha preta, esses jovens fazem parte do cotidiano de Frutal. Ser cobrador exige atenção, responsabilidade e um tratamento pessoal diferenciado. Em algumas lojas, o cobrador é o primeiro a chegar e o último a sair.
A rotina dos cobradores não é nada fácil. Faça chuva ou faça sol (e que sol nesse Frutal!), eles estão lá, todos os dias pra cima e pra baixo com as suas bicicletas e a pastinha preta. Deve-se ressaltar que não sou frutalense e essa atividade, para mim, é muito atípica, ou, melhor dizendo, é uma característica que encontrei em Frutal.
Se existem os clientes que não gostam de ouvir as palmas na porta de casa e, na sequência, enxergar algum cobrador que está ali no exercício de sua profissão, eu digo: nada é tão ruim que não possa piorar. Pense nos telefonemas das agências bancárias, das operadoras, das grandes empresas que ligam, fazem você conversar com um estranho que fala tudo certinho pra lhe dizer que existe uma dívida.
Na cobrança “à la Frutal” existe, pelo menos, o relacionamento humano. As pessoas se conhecem e a conversa pode ser menos mecânica do que é quando um banco te liga. Pense melhor então, quando o cobrador bater à sua porta. Pode ser muito pior.
As cobranças e o perigo
Andar de bicicleta o dia todo sem correr risco algum é algo impossível. Andar o dia todo e todos os dias então, nem se fale. Acidentes, quedas, micro-atropelamentos e alguns imprevistos acontecem. Um dos muitos cobradores frutalenses falou sobre essa rotina. O nome e o lugar onde trabalha não serão revelados para que não seja criado nenhum tipo de problema.
O jovem não é de Frutal e veio pra cá aos 15 anos, sem conhecer nada. “No começo foi difícil, mas hoje conheço todos os clientes. Quando coloco as notinhas na bolsinha já sei onde tenho que ir.” Em um dia, são feitas cerca de 90 cobranças em toda a cidade. Seja no centro ou no Frutal 4, o cobrador tem de ir.
Numa tarde, enquanto ia de um lugar para o outro com a bicicleta, nosso amigo se deparou com uma porta de carro na sua frente: “Eu estava descendo com a bicicleta. De repente, a porta do carro abriu e caiu tudo. Bicicleta pra um lado, notinha pro outro. Foi uma confusão. Ainda queriam que eu pagasse a porta. O jeito foi fugir.”
Das inúmeras histórias engraçadas, existe uma que se destaca sobre as outras, conta o jovem cobrador, já com menos vergonha do que no início da entrevista: “uma vez eu comprei um óculos caro. Uns R$200,00. Mas parcelado. Comprei e fui visitar um cliente. Bati palma e ninguém atendeu. Entrei e bati na porta. Aí eu vi um cachorro vindo na minha direção correndo e a dona gritando ‘Para Baby, para!’. Dei a volta e disparei, mas não consegui abrir o portão, então pulei o muro. O problema é que eu estava com o óculos e aí ele quebrou. A cliente até perguntou, mas na hora eu disse que tinha sido apenas um arranhozinho, que estava bom. Afinal, tinha que receber a notinha.”
Além das histórias engraçadas, o jovem, que sonha em fazer uma faculdade de administração, tem gosto por aquilo que faz. E deixa bem claro que existem clientes difíceis, a rotina é complicada, mas ser cobrador é bom. Se você não gostar, ao menos um pouco de história terá para contar para os amigos.
Prefira o cara a cara
Por mais desagradável que seja receber um cobrador em casa – e isso acontece, afinal a inadimplência no Brasil tem crescido – vamos levantar a bandeira aqui: prefira receber alguém e não um telefonema.
Telefonema é chato, não toma cafezinho, tem umas musiquinhas insuportáveis. O cobrador pode ser engraçado, falar sobre qualquer coisa e até perder uns minutinhos para um pão de queijo ou uma coca-cola. Por isso, quando ouvir umas três palminhas na porta de casa e ver uma notinha de cobrança, prefira o cara a cara. E se você está inadimplente, tenha quase certeza, pelas estatísticas, que a vizinha fofoqueira também está.
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