Por Lausamar Humberto, Patrícia Paola Almeida e Rafael Del Giudice Noronha
No escritório bem decorado, dois detalhes chamam a atenção: o rádio antigo atrás da mesa do homem de cabelos poucos e grisalhos e o bar, que, ao invés de ostentar um caro uísque, traz três garrafas de cachaças populares ocupando o espaço junto a pequenos potes de amendoins e outros petiscos.
O homem de cabelos poucos e grisalhos por trás da mesa de vidro é um dos mais importantes empresários da região. Sua empresa possui sete filiais e emprega de forma direta mais de 170 funcionários. Construiu sua carreira praticamente toda fora do mundo político. E agora quer ser prefeito de Frutal.
Mauri José Alves é gaúcho de David Canabarro, cidade próxima a Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, que só tornou-se realmente um município quase um ano depois do nascimento do menino, no ano de 1964.
Jovens deixarem a cidade natal e tentar a vida em outra região é comum. Seja para buscar novas oportunidades de emprego, seja para estudar, a partida acontece, mais hora, menos hora.
E esta hora chegaria para Mauri. Filho do campo, até os 18 anos viveu no pequeno sítio de 20 hectares dos pais. Desde os sete anos já estava na labuta. Trabalho na lavoura todo manual, com boi, arado. Compraram um pequeno trator apenas em 79. Sem energia, à noite a vida era iluminada por lampião a gás. O pai nunca teve dinheiro. Tinham o que comer - do que era nascido da própria terra -, nunca passaram necessidade, mas dinheiro sobrando não tinha. Seus pais continuam morando no sítio.
Nessa época participava do CTG (Centro de Tradições Gaúchas). Era declamador de poesia. Poesia regional, das quais se lembra, mas não quis declamar para a reportagem.
A educação inicial foi em escola rural. Escola na cidade só no ginásio. Mauri considera que sempre foi um aluno normal. Nunca teve dificuldade com nenhuma matéria. É formado em economia pela Uniube. Já não teria paciência para outra faculdade, mas valoriza todos os cursos que fez. O empresário que é foi se aprimorando com todas essas lições. Gosta de ler biografias. A leitura atual é a do fundador da Apple, Steve Jobs.
A saída do Sul se explica rápido. No sul quem tem terra não vende. É difícil expandir. Mauri queria trabalhar com agricultura. Num primeiro momento pensou em Mato Grosso. Acabou em Minas, com uma breve passagem por São Paulo.
Em terras mineiras
“Quem diabos têm uma penteadeira? Isso é do tempo de minha avó”, estranhou Márcio Santana Brito. Um Fiat 147 vermelho, uma cama e uma penteadeira. Com estes bens Mauri aportou em terras frutalenses. Márcio é protético e acolheu Mauri em uma república que montou depois que seus pais haviam mudado para Goiânia. Não de estudantes, mas de viajantes, trabalhadores. Foi o primeiro a recebê-lo e tornou-se o primeiro amigo.
Márcio lembra-se bem deste tempo. “O gaúcho era branquinho, magrinho e não tinha lugar pra ficar. Aí eu disse: a república é igual a coração de mãe.” Foram tempos de vacas magras. O cardápio quase sempre era arroz, feijão, macarrão e ovo. Como Mauri circulava muito pelas fazendas, Márcio brincava: “vê se ganha umas mandiocas pra gente dar uma variada na comida.” Entrava semanas sem comerem uma carne. Um dia um dos companheiros de república trouxe carne, começou a se achar o dono da cocada e a tirar sarro dos outros. Um vendedor de Pirapora, meio esquentado, não aceitou e chamou pra briga. Mauri apaziguou. Era de seu gênio, diz Márcio. “Sempre foi tranqüilo. Os vizinhos o adoravam.”
Só se viam de tardezinha. Mauri levantava às 5h da manhã e picava a mula no fietinho. Vendia o “Adubo 4/14/8”. E vendia bem. Certa vez, Marcio arrumou um emprego na concorrência. Passou a ser vendedor da Manah. “Virei concorrente morando junto com o Gaúcho. Quando disse a ele, riu. “o sol nasceu pra todos”, comentou.
Mas o protético não se dava bem com o comércio. “Clamei minha situação pra ele. Um dia ele me chamou e disse pra darmos uma volta. Naquela tarde vendi mais de 200 toneladas de adubo. E eu era concorrente.”
Logo Mauri conheceu Wilma, sua futura esposa e resolveu casar. Já tinha definido que aqui seria sua vida. Chamou Márcio para padrinho. Márcio ponderou: “Mauri, você conhece tanta gente, fazendeiros, que podem presentear com uma coisa melhor.” “Estou te chamando porque você é o meu amigo. Foi a pessoa que me acolheu. Não importa se não pode me dar uma galinha, você vai ser meu padrinho.” Quando Márcio casou tempos depois, também chamou Mauri para padrinho. Mas avisou: “olha, você já está muito bem de situação, não vou querer uma galinha de presente não.”, lembra e ri.
A família
Quando foi abrir uma conta para a sua empresa, a Coragro, Mauri conheceu Wilma, bancária. O ano era o de 1985. “Mauri era um rapaz cheio de sonhos. Passava a impressão de coragem, determinação.” Essa foi a primeira impressão da atendente do Banco Real, que em 1989 se casou com Mauri. O casal tem três filhas. Verônica, de 21 anos, Vitória, de 17 e Luiza, de 14.
Mauri é caseiro. Gosta de cozinhar um frango caipira e assistir futebol. Futebol nacional, vê quase nada do estrangeiro. Achou estranhou quando chegou em Minas encontrar poucos torcedores de Atlético e Cruzeiro. Mas a TV só passava jogos de São Paulo e Rio. A filha Luiza acompanha o pai assistindo aos jogos do Internacional, time do qual Mauri é torcedor doente e sócio de carteirinha. No ano passado assistiu um jogo da Libertadores no estádio. Falcão é o ídolo maior do volante amador. Márcio garante que o amigo era muito bom de bola. Questionado se seu estilo era mais Falcão ou Batista, Mauri é direto: “era mais Caçapava”.
As filhas são o xodó do empresário. E não é um pai ciumento, conforme afirma Verônica. “Ela é formada em dança e está com seu negócio. Já é uma pequena empresária”, diz um Mauri orgulhoso da filha mais velha. Tanto ela quanto Luiza dizem que o pai, em casa, é diferente da figura pública que as pessoas conhecem. É muito brincalhão e divertido. Não é de muitas broncas, é objetivo e simples. “Fala pouco, mas é muito”, afirma a caçula Luiza.
Questionadas sobre o desejo do pai de ser prefeito, Luiza diz que ficou assustada no começo, mas o apóia. Verônica lembra que o pai gosta de ver as coisas bem feitas e que tem vontade de ajudar a cidade. “Ele quer uma cidade melhor pras suas filhas”, diz. Luiza é categórica: “ele sempre nos apoiou. Agora que ele precisa, vamos estar do lado dele.”
Nos fins de semana Mauri costuma visitar as fazendas. De família católica, é praticante. Frequenta a igreja Nossa Senhora do Carmo. É noveleiro, sempre que pode assiste alguns capítulos. Na música, Mauri conta que não abandonou suas preferências por música popular gaúcha, mas em Frutal aprendeu a gostar do bom e velho sertanejo.
Coragro
Uma das maiores empresas da região, a Coragro nasceu em um pequeno escritório ao lado do Posto do Paulo, no centro de Frutal. Em 86 passou a ter sede própria, onde hoje é a empresa Rosa Mística. Funcionou ali até 2000, quando foi transferida para a moderna sede atual, na avenida JK. O nome foi inspirado por uma empresa que um tio de Mauri tinha, a Cotagro. Só trocou o T pelo R.
Logo no começo Mauri trouxe o irmão Luiz Carlos para ajudá-lo. O outro irmão, Aírton, chegaria logo depois. São sócios até hoje. Até 90 trabalhavam só com vendas, depois passaram a plantar soja. Quando veio para Frutal Mauri percebeu o potencial de expansão. “A agricultura ia crescer nesta região, fomos crescendo com o crescimento da região”. Mas cresceu devagar. “Quem vai com muita sede ao pote corre o risco de se afogar.”
Empresário experimentado no ramo e também por sua vivência no Sindicato Rural, Mauri avalia que a agricultura vive um bom momento, mas faz um alerta: “a agricultura é muito cíclica. É hora do agricultor se estruturar financeiramente para a hora que chegar a crise ele estar preparado. A produtividade da agricultura deu um salto muito grande.”
Questionado como foi possível alcançar este estágio de desenvolvimento da empresa, Mauri começa a revelar seu jeito de administrar. Diz que trabalho e boa vontade não são o bastante para crescer e permanecer bem posicionado no mercado. A relação pessoal é necessária, afinal dentro da empresa existe todo tipo de gente. Do seu jeito, Mauri conseguiu e consegue estabelecer relações com todos os funcionários, para que sua empresa continue a crescer.
“Conheci o Mauri na Coragro, onde trabalho faz 19 anos. Ele é um bom patrão e amigo. Sempre está nos churrascos com a gente.” Assim, Valdir Guilherme Primo, o Valdirão, que tem 54 anos e é chapa no armazém da empresa, resume a relação com o chefe.
Dino Marques de Oliveira tem 28 anos e trabalha no escritório da Coragro. Chegou à empresa no ano de 2003 através de um convite feito por Mauri. Segundo ele, Mauri é sempre um dos primeiros a chegar ao trabalho e quando é preciso ser mais exigente, ele é. Gosta de conversar com todo mundo e passa sempre um pensamento positivo. “Nós temos um relacionamento aberto e carta branca para fazer o que é necessário para a empresa. Se errarmos, arcamos com as consequências, mas temos total respaldo para trabalhar com tranquilidade” afirma Dino.
Sindicato Rural
No início dos anos 2000 foi convidado para participar na diretoria do sindicato. Não tinha pretensão de ser presidente. Presidente por seis anos e meio, Mauri e toda a diretoria que lá está hoje, conseguiu reestruturar o sindicato. Sobre esta experiência, Janes Cesar Mateus, o Janão, atual presidente, analisa: “O único defeito que encontro no Mauri é a timidez. Mas aqui dentro, comandando os 14 diretores durante seis anos e meio ele sempre foi transparente e muito honesto. Até hoje, mesmo afastado, quando precisamos ele está disponível.”
Janão pensa que Mauri fez uma administração correta, pelo fato de ser ao mesmo tempo vendedor e comprador dos produtos agrícolas: “ele está em ambos os campos, tanto na venda, quanto na compra. Isso faz com que os produtores e comerciantes confiem nele.”
Foi no sindicato rural que o embrião da pré-candidatura foi gerado. “Ali dentro, conversando com amigos, eles diziam: você tem que ser candidato a prefeito. Falar demais, pega”, brinca Mauri. Na eleição passada viu que não era o momento.
A pré-candidatura
Mauri é reservado, conversa pouco. Observador, não é daquelas pessoas que distribuem sorrisos por aí. “Não sou tão expansivo, aberto. Não sou muito político”, ri. Mas isso não é um problema para quem se prepara para enfrentar uma campanha? Mauri diz que não. Os planos que têm para a cidade e os apoios que vem recebendo animam o pré-candidato.
O amigo Márcio vê nesta reserva uma qualidade de Mauri: “Ele nunca gostou de aparecer. Jamais teve alguém pra ficar escrevendo no jornal: Mauri fez isso, Mauri fez aquilo. Mas sempre foi participativo. Ele sempre está em encontros na igreja, festas para entidades.” Márcio aposta que o amigo vai disputar a eleição “pelas pessoas que estão aderindo a esta idéia de ter um administrador já muito testado na prefeitura.”
As conversas sobre a pré-candidatura são, por enquanto, informais e pessoais. Não há ainda movimentações partidárias.
“Ele pode ser um bom administrador para Frutal, da mesma maneira que foi no Sindicato. A cidade poderá continuar crescendo, pois Mauri tem a qualidade de tomar decisões importantes rapidamente. Timidez? Pode atrapalhar no começo, mas com o passar do tempo a população verá que Mauri é uma ótima pessoa.”, analisa Janão.
Dentro da Coragro, a candidatura também é comentada: “Existem comentários. Acredito que ele vai sair sim. É um sonho que ele abraçou.”, avalia Dino, que diz ainda que nada mudou na empresa com o fato de Mauri ser um pré-candidato: “Há, é claro, uma maior segmentação, uma divisão no trabalho, afinal são sete filiais. Mas este é um processo comum nas grandes empresas, não se deve ao fato da pré-candidatura e sim, a continuidade do crescimento”, diz Dino.
Por que ser candidato? Mauri justifica sua decisão: “Tudo que construí foi nesta cidade. Quero retribuir isso com meu trabalho, com minha experiência de ter acompanhado a vida de Frutal nos últimos 30 anos. A questão do simples poder, do salário, isso não me atrai de maneira alguma.”
Em um possível mandato, Mauri não acha correto falar em prioridades. Acha que é preciso balancear as atenções. “Não dá pra falar em organizar as ruas e estradas do município e deixar a saúde e a educação de lado. Se um setor não vai bem, há um desequilíbrio.” Mas se preocupa com a segurança. “Este é um dado preocupante e tem que se acompanhar bem de perto.”
Mauri não acredita em revolução, em se chegar e mudar tudo. “Em qualquer lugar que se chegue é preciso conhecer para mudar. É preciso ver a realidade do negócio.” Até porque acha que a prefeita Ciça tem feito um bom papel. “Ciça foi parceira no Sindicato. A construção do CIAP, trabalho do Nárcio e Zé Maia, teve o apoio da prefeita. Ela fez o dever de casa, é uma pessoa íntegra e sai com o dever cumprido.
Fez uma opção de priorizar saúde e educação. No geral, leva uma nota oito.” Acredita que pode ter o apoio de Ciça? “Claro, será muito bem recebido. Uma prefeita que termina o mandato com uma popularidade de quase 80% qualquer candidato deseja o apoio dela.”.
Sobre o perfil de uma possível administração Mauri, o empresário sintetiza: “Administrar o dinheiro que entra é mais fácil. É preciso que o prefeito seja mais um administrador. Hoje o que faz a empresa crescer é descentralizar o poder. Acho que no poder público é igual. Você precisa ter as pessoas certas nos lugares certos. Estes escolhidos têm que dar conta e fazer o negócio andar.”
Mauri diz não ter muitos ídolos políticos, mas admira o ex-presidente FHC. Lembra da época em se ganhava dinheiro só com a especulação. A partir do Plano Real o Brasil entrou no rumo. “O Real permitiu o planejamento. Antes uma caneta custava um real e dali a um mês custava dois. É impossível ter desenvolvimento com a economia deste jeito. FHC organizou isso. O Brasil hoje se toca quase sozinho. Basta não atrapalhar muito.”
Gosta do estilo e avalia positivamente o governo Dilma. “A presidente é técnica. Dilma é um estilo, Lula era outro. Ela é discreta, Lula aparecia todo dia. Gosto da mulher no poder. A mulher é igual ao homem ou até melhor - é mais responsável.”
Entra em detalhes apenas em uma área específica, o esporte, não escondendo a paixão: “acho que esporte tem que ter orçamento, secretário. Separar da cultura. Dá pra arrumar os campinhos. Não precisa de muito dinheiro, é só mais incentivo. E precisa apoiar a cultura. Cinema, teatro. Uma peça que venha a Rio Preto, a Ribeirão, traz pra cá. Tem que haver uma participação do poder público.”
Sobre o apoio dos deputados, Mauri afirma: “sempre apoiei e vou apoiar Nárcio e Zé Maia. O patamar político do agora secretário de estado Nárcio é muito importante. É preciso aproveitar isso para o desenvolvimento de Frutal.”
Aplicar as estratégias de administração de uma empresa bem sucedida pode não ser tarefa fácil quando se trata de um município, mas Mauri diz e garante que é de sua história de sucesso que vai tirar o melhor para aplicar em Frutal. É o que pretende combinar com os eleitores.